terça-feira, 23 de março de 2010

Observandando

Hoje, o que me faz viajar é olhar pela janela da minha sala e observar o ritmo que as coisas andam lá fora. Em frente, temos o prédio azul, onde a menina de cabelos brancos fica com a cabeça pra fora fumando escondido, outro dia ela tinha companhia, acho que era um paquera de trabalho ou algo do tipo, dividiram o mesmo cigarro, se olharam bastante e depois saíram, juro que os imaginei se pegando no corredor, mas achei melhor não me empolgar e pular para a casa ao lado, esta que fica espremida entre dois gigantes de 12 andares, ela é pequena, com paredes descascadas e grades nas janelas, me sufoco só de olhar, sempre imagino uma senhora fazendo inalação em uma cadeira de balanço na sala, não sei porque, só imagino isso, gosto mesmo é do cabeludo que senta para se bronzear e ler, ele sempre aparece depois das 13h, na hora do sol mais radiante, com uma bermudinha cinza e um livro em mãos, senta na cadeira de praia e passa a tarde toda lá, ele parece ser bem legal, tenho vontade de puxar papo, pensei em gritar um “OI” outro dia, mas fiquei com medo de ficar desempregada. O pessoal daqui o chama de mongolzinho, realmente a aparência dele puxa pra este lado, já que se trata de uma moita encaracolada, com peito fundo, corcunda e com aproximadamente 1,80 de altura muito mal distribuído em um chassi de 55kg no máximo. Diferente do regatão que paquera na saída da escola, ele encosta um pé na parede e fica lá o dia todo, tem um topete com gel, braço definido, e só, cérebro não tem, certeza, afinal tem cara de 30 e a mais velha da escola tem 17, acho engraçado o jeito que ele se olha, da conta de ser seu próprio “objeto de desejo”, mesmo que todos o achem um babaca, sai de lá realizado e com cara de sedutor, tem também a senhora que passeia com a mistura de poodle com coisa nenhuma, ela limpa o coco do cachorro, bota numa sacolinha e joga no canto da calçada, meu, que vontade de falar, “já que é pra deixar na rua, nem coloca na sacola (velha filha da puta) senhora, pelo menos assim é mais fácil de biodegradar”, até atravesso a rua quando ela vem chegando, nossa, que raiva que me da.
Depois de duas semanas na empresa descobri uma câmera em cima da minha cabeça, me meteu medo e insegurança, não consigo agir com naturalidade, a ponto de atender ao telefone que não tocou e anotar o recado que ninguém deu, só pra mostrar excelência no serviço, fico imaginando que podem surgir comentários sobre mim, “olha lá, é o 5° café que ela toma”, “Olha o tanto de folha de sulfite que ela estragou”, “cochilou, olha lá, cochilou”. Loucura minha, eu sei, mas não adianta, não consigo mudar. A preocupação de “estão falando de mim” é antiga, espiava a reunião da escola pra ver o que a professora falava pra minha mãe, acho que é mal de quem vem de cidade pequena, “você é o que o povo fala”, sei que aqui é bem diferente, mas eu preciso analisar, é uma tentativa de absorver o que eu vejo de melhor em cada um, funciona bem na teoria, mas na prática são apenas anotações, afinal, pra quem gosta de observar essa cidade é um banquete.

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